O deputado federal e ex-secretário estadual de Saúde, Jorge Solla (PT-BA) é um dos milhares de defensores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Com a segunda condenação do maior líder do seu partido, anunciada esta semana, ele acredita que o objetivo de alguns integrantes da Justiça e de políticos influentes é fazer Lula morrer na prisão e, com isso, mandar uma mensagem para os brasileiros que pensam em enfrentar a elite que governa o país. Em entrevista ao BNews, Solla também avalia o Governo Bolsonaro, o pacote anticrime de Sergio Moro e a crise no Planserv, entre outros assuntos.
BNews – Como foi para você ver a segunda condenação de Lula?
Jorge Solla - É o mesmo absurdo que fizeram em relação ao triplex. Você vê que, nos dois casos, ele é condenado por uma reforma em um imóvel que não é dele, com um recurso originário de algo que não se conseguiu comprovar que ele tenha solicitado ou mesmo autorizado algo em troca. Então, não há ato de ofício, não há propriedade ou posse do imóvel e, no caso do triplex, não há nem a reforma que foi dita. Conseguiu-se verificar depois que a suposta reforma que o juiz Moro utilizou para atribuir o ato de corrupção não chegou nem a existir. É um negócio absurdo, não estamos tratando apenas de uma ilegalidade por parte dos órgãos do Judiciário, é uma perseguição política e, mais do que isso, é algo criminoso você condenar um inocente. Qualquer um pode errar, mas nesse caso não é um erro por uma falha técnica. Nesse último caso do sítio, a juíza chegou ao ponto de retirar do processo provas periciais que vieram pela defesa, argumentando que elas não podiam ser usadas porque foram aportadas pela defesa. Isso é um absurdo!
No caso do triplex, o juiz Moro negou à defesa o acesso a documentos essenciais que ele alegava que comprovavam a suposta reforma. Só vieram aparecer depois da sentença e depois se comprovou que eram documentos forjados. O juiz deu nove anos de prisão como pena e, depois, na segunda instância, quando perceberam que, com nove anos de prisão ele não poderia ser preso por causa da idade e do tempo do processo e seria prescrito, mudaram para 12 anos em um mês, sem nenhuma justificativa jurídica. E agora, no processo do sítio, coincidentemente, também são 12 anos e alguns meses, também o tempo mínimo necessário para não prescrever no caso de Lula. Isso é mais do que algo criminoso, é uma violência. Eles tinham o objetivo de tirar Lula da possibilidade de ser candidato a presidente e conseguiram.
Os processos comprovam que Lula é inocente. Nenhum dos dois processos conseguiu comprovar nenhum crime. Agora, a gente ainda se pergunta por que eles estão continuando com isso? Por que eles querem que Lula cumpra prisão perpétua e morra na prisão? Porque ele é um preso político que só não está tendo tortura física, mas está sofrendo tortura psicológica e isolamento. É um preso que não pode dar uma entrevista, um depoimento, que não pode sair para o velório do irmão, que não pode visitar familiares num processo de perda do ente querido. Nem quando estava preso durante a ditadura, Lula passou por isso. Eu tenho a tese que isso é para dizer a qualquer um desse país que, se um presidente que fez tanto por esse país e é reconhecido internacionalmente está preso desse jeito, não ouse vir contra a elite porque você vai apanhar igual à mala velha.
BNews – Como você avalia o Governo Bolsonaro?
Jorge Solla - O Governo Bolsonaro conseguiu ser ainda pior do que a estimativa que existia. A gente sabia que seria pior que o Governo Temer, mas não tínhamos elementos ainda para ter dimensão da gravidade que essa composição do governo traria para a situação do país. Eu tenho acompanhado a composição dos ministérios do Governo Federal desde final dos anos 80 e é, de longe, o pior quadro de composição. Nunca tivemos tantos ministérios formados por tantos quadros incompetentes, sem qualificação técnica, sem experiência política e sem capacidade de gestão pública. Não é por acaso, inclusive, que você tem visto o constante bate-cabeça. Já virou até piada que a grande novidade do Governo Bolsonaro é ter dois Diários Oficiais, um de manhã dizendo o que vai fazer e outro à noite dizendo que vai desfazer o que disse de manhã que iria fazer.
É muito grave o quadro e a gente fica muito preocupado porque você tem ministérios, como o da Educação, onde os principais cargos estão ocupados por pessoas que nunca passaram pela gestão pública efetivamente. Não passam confiança pela falta de experiência. Claro que são pessoas que podem vir aprender a manejar essa responsabilidade, mas é óbvio que leva um tempo pelo menos até se apropriarem, se for possível essas pessoas chegarem a tanto.
Não tem um programa de governo claramente estabelecido, a não ser diretrizes do tipo reforma da Previdência e armamento em massa da população. Além disso, você tem de um lado um núcleo de pessoas que pregam situações completamente aberrantes, como é o caso do tríplice absurdo (ministros da Educação e das Mulheres, e o chanceler do Itamaraty). Uma nota que saiu recentemente no MEC todo mundo achava que era fake de tão absurdos que eram o conteúdo e os erros de Português, isso em uma nota oficial do Ministério da Educação. Depois, se confirmou que não era fake. Então, é uma situação realmente vexatória e muito preocupante.
BNews – Qual a sua opinião sobre o “pacote anticrime de Sergio Moro”?
Jorge Solla - Primeiro, ele tenta apresentar propostas para uma gama muito grande de questões que merecem uma análise mais cuidadosa caso a caso. Segundo, alguns especialistas da área têm apresentado erros graves do ponto de vista da prática legislativa, questões que são Cláusulas pétreas constitucionais que estão sendo alteradas por lei ordinária. Isso mostra um desconhecimento absurdo da prática legislativa por parte de alguém que está ocupando um posto tão importante como um ministério.
Tem medidas que não terão eficácia para reduzir a criminalidade e garantir maior segurança para a população. Associando grande parte dessas medidas à disseminação de armamento, é um cenário no qual a violência não vai reduzir, vai prosperar. No entanto, não dá pra jogar o conjunto todo fora, a questão da segurança pública é importante e precisamos aperfeiçoar a legislação. Tenho conversado com os colegas de bancada e, se permitirem e não quiserem passar o trator tentando construir a maioria sem aprofundar o debate, o ideal seria desmembrar esse pacote, montar comissão para cada um dos grandes grupos de intervenção, para que essa comissão possa estudar as medidas, aperfeiçoá-las, fazer um debate e corrigir possíveis erros, ou seja, fazer o papel que cabe ao Legislativo. Não deve passar por uma rejeição total ou aprovação total, merece um aprofundamento e um debate cuidadoso.
BNews – Quais os motivos da crise no Planserv?
Jorge Solla - Nós estamos vivendo momentos de dificuldade e o Planserv não é uma ilha. Quando o governador Wagner entrou em 2007, o Planserv estava falido. Conseguimos uma recuperação muito boa nos governos Wagner e Rui continuou, a tal ponto que temos hospitais privados na Bahia que são Planserv-dependentes. Se falir, eles falem junto. Hoje, o Planserv é o maior plano privado da Bahia, são mais de 500 mil vidas. Os dependentes do Planserv equivalem ao número de dependentes na Cassi, só que a Cassi é pro Brasil todo e o Planserv é só na Bahia.
O Planserv hoje está vivendo dificuldades e isso se deve, por um lado, ao problema da economia em geral: queda de arrecadação, não tivemos reajustes importantes nos salários dos servidores que contribuem, não tivemos possibilidade de maior aporte financeiro por parte do estado, mas a inflação médica continuou e é maior do que a média da inflação geral. Os gastos do setor saúde sobem duas ou três vezes por ano, mais do que a inflação oficial, e isso repercute. Acho que é um momento que precisa de muito cuidado, de muito bom senso, de capacidade gestora e habilidade nas negociações porque não dá para matar um projeto tão importante quanto o Planserv. Não se pode tentar nesse momento arrancar reajustes salariais/de pagamentos que não correspondem à capacidade econômica hoje.
BNews – Por que a Regulação na Bahia também está em crise?
Jorge Solla - Não há crise na Regulação. Crise é quando você tem um processo de aprofundamento de dificuldades. Felizmente, o que temos observado pelos dados que temos acompanhado é o contrário. Temos um processo que, ano a ano, tem aumentado a oferta. A Regulação é um mecanismo de gestão, no qual, de um lado, você identifica demandas (pacientes que precisam de exames, cirurgias, internamentos...) e, do outro lado, você vai ver a oferta mais adequada existente. A dificuldade é que a demanda é maior do que a oferta. Como temos mantido o patamar de investimentos, essa lacuna tem diminuído ano a ano, mas não resolve tudo. De 2007 para cá, já aumentou em seis vezes o número de leitos de UTI pelo SUS na Bahia, mas isso não resolveu todas as demandas e não vai resolver de imediato porque você tem demandas muitas vezes mais diferenciadas. Nós temos áreas que melhoraram bastante e quase não têm essa diferença entre demanda e oferta, mas há outras que ainda precisamos avançar bastante, como a de cirurgia cardíaca.
BNews – Quais os seus projetos para a sua nova legislatura na Câmara?
Jorge Solla - Ajudar o governador Rui Costa (PT) e toda a sua equipe para darmos continuidade às ações que têm trazido resultados muito positivos. Com todas a dificuldade nacional, o Governo do Estado tem avançado bastante, inclusive na área de saúde, com as novas policlínicas, hospitais, investimentos na atenção básica e em outras áreas.
O outro ponto é a luta no Congresso Nacional para evitar que o povo brasileiro perca mais direitos ainda. Não podemos permitir que o trabalhador rural perca o direto à aposentadoria e que o trabalhador urbano venha se aposentar somente em idades muito avançadas, isso quando ele conseguir se aposentar. O direito previdenciário é algo que iremos lutar muito para evitar que venha ser destruído. Iremos continuar a luta contra a destruição dos direitos trabalhistas. Essa história de carteira de trabalho verde e amarela para jovens, sem direito a férias, 13º, FGTS, é semiescravidão, é querer usurpar algo tão essencial à vida das pessoas. Isso vai repercutir na saúde do trabalhador, com o surgimento de doenças graves e a mortalidade vai aumentar. Não podemos permitir também que políticas tão importantes como universidades públicas voltem a ser algo restrito à elite brasileira. Iremos lutar para que o Bolsa Família não seja destruído.
Na área de saúde, vamos lutar para preservar o SUS, para recuperar o orçamento e a capacidade de financiamento do SUS. Não dá para aceitar que a Emenda Constitucional 95 venha prosperar. Em dois anos, acabou a Farmácia Popular no Brasil em toda a rede pública e cortou quase metade na rede privada, e parou o crescimento dos recursos para novos serviços. Vamos ter que continuar fazendo a política de redução de danos: cada proposta que o governo fizer para destruir direitos que a gente não permitir aprovar, vai ser uma vitória. A nossa meta vai ser preservar os diretos dos brasileiros contra o avanço dessa direita ultraliberal, do ponto de vista da economia, e ultraconservadora, do ponto de vista dos costumes.
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